terça-feira, 26 de maio de 2009

O tempo não passa para quem ama

Minha mãe se foi para sempre há quase dez anos. Dias desses me peguei referindo à sua morte como se ela, a morte (a rasteira de sua ausência), tivesse ocorrido há pouco menos de três anos, há tão pouco tempo.

Morrer pode ser algo relativamente grande, distante na geografia, para quem não gosta. Para quem ama (e respeita), o tempo não passa. É tão eterno, mas tão curto que as lembranças são janelas próximas à cabeceira de onde nos apoiamos. E nelas, nunca deixamos de sonhar ou de sentir a vida.

Ultimamente, dedico boa parte de meu tempo ocioso ao amor de um pequeno animal quadrúpede, perninhas tortas e com o raciocínio carinhosamente de um felino: um gato.

Não consigo imaginar minha vida sem ele, pequena bolinha andante de pelos e ronroneios a me perseguir implacavelmente pelos caminhos quadrados do apartamento: o Nego. Eu e minha mulher, Carol.

Há poucos dias, num hipermercado, um casal se esbaldava na compra de papinhas e fraldas para seus netos gêmeos (ainda de colo). Ao ver- me com uma ‘papinha’ felina na mão, a senhora no alto do promontório de sua vida ironizou:

– E os filhos, não sobra tempo para eles?!!!

Gelei sua ironia num silêncio que veio bolinado de um sorriso de quem sequer teve o desatino para perceber a ironia.

– Sobra, mas não os vejo como alforria para a felicidade.

Senti uma certa frieza sua ao ouvir a resposta. E partimos cada um para seus destinos.

Não entendo a resistência que alguns têm em relação aos que amam seus animais como amam seus semelhantes ou aos que veem a morte como uma distância tão intransponível como o é para o senso comum dos que cultuam a morte como herança sádica do catolicismo. Na verdade, nada mais do que a reação do vizinho que não bate na porta para nos afagar, mas para afundar o nosso crânio. A resistência geralmente parte dos egoístas, dos que acreditam somente na equação de que o amor é forjado numa forminha de gelo ou fabricado numa forminha de bolo e que, nessas, cabem apenas os sentimentos dos que juram ter só eles os sentimentos e desses que pregam gritar abaixo as suas emoções, como se fossem a única certeza do mundo a amar e desamar as pessoas, as coisas. Não é certo pensar que a morte existe igual para todos.

Morrer para uns é tristeza. Para outros, tempo de luz. E amar nunca será igual para todos.

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